No último dia 18 de dezembro (sábado), completa 25 anos do assassinato do sindicalista João Canuto de Oliveira primeiro presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) de Rio Maria-Pará.
HÁ 25 ANOS TOMBA O SINDICALISTA JOÃO CANUTO PELA BALA DO LATIFÚNDIO
Cleber Rezende[1]
Na luta pela reforma agrária, pela defesa e promoção dos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras rurais, muitos trabalhadores/as e suas lideranças tombaram pela bala do latifúndio Brasil afora. A morte sistemática de dirigentes sindicais rurais, religiosos, advogados e militantes de partidos de esquerda colocam em evidência a impunidade no campo e requer resposta política das autoridades competentes.
O município de Rio Maria no sul do estado do Pará, palco de muitas lutas camponesas. Desmembrado de Conceição do Araguaia em 1982, os trabalhadores rurais deste município travaram uma luta pela emancipação sindical da categoria e pela fundação do Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) no município recém emancipado. Na época o STR de Conceição do Araguaia era presidido pelo médio proprietário rural conhecido como Bertoldo Lira nomeado pelo INCRA a serviço do regime militar e aliado do latifúndio. Segundo os trabalhadores rurais Bertoldo podia ser classificado como “pelego”, posto que, não defendia os interesses dos trabalhadores.
Em 1983 foi criada a delegacia sindical dos Trabalhadores Rurais de Rio Maria sendo eleito, provisoriamente, como presidente o trabalhador rural João Canuto de Oliveira. Após a conquista da independência do sindicato de Conceição do Araguaia João Canuto foi eleito por seus pares como presidente do agora recém criado Sindicato. Canuto se torna uma das principais lideranças em defesa da reforma agrária, apoiando os camponeses em suas lutas pelo direito a posse da terra na região Sul do Pará.
O latifúndio, principalmente, aqueles que tinham grilado terras do estado ou ocupado indevidamente, eram ligados a União Ruralista Democrática (UDR) e incomodados com os avanços das ocupações de terras por parte dos trabalhadores rurais, definem e implementa o plano de eliminação física de João Canuto.
Em 18 de dezembro de 1985 tomba o sindicalista João Canuto de Oliveira presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) de Rio Maria-Pará com 18 tiros certeiros de pistoleiros a mando do latifúndio. De acordo com inquérito policial entre os acusados de serem mandantes estavam o prefeito de Rio Maria a época (1985) o fazendeiro Adilson Carvalho Laranjeira e o fazendeiro Vantuir Gonçalves de Paula. Vale ressaltar que estes foram os dois conduzidos ao Tribunal do Júri, no entanto o assassinato foi planejado por um numero de aproximadamente 20 pessoas, incluindo políticos, fazendeiros e empresários.
João Canuto além sindicalista era militante ativo do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) defensor da reforma agrária, da justiça social no campo e na cidade e do socialismo, tendo concorrido à prefeitura municipal de Rio Maria em 1982 pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB) na corrente progressista onde se aglutinava os militantes de esquerda, perdendo a eleição para Laranjeira por meio da “fraude incontestável” no referido processo eleitoral em favor do representante das elites latifundiárias.
O assassinato de João Canuto representou mais do que a eliminação de um líder sindical, perde-se uma grande liderança política e ativista comunista da classe trabalhadora rural da região sul do Pará e do Brasil. Morreu João Canuto, mas não suas idéias e a luta pela reforma agrária e pela apuração e condenação dos pistoleiros e mandantes de seu assassinato, sendo uma luta que mobilizou diversas entidades de direitos humanos nacionais e internacionais inclusive a OEA. No entanto, a morosidade da justiça paraense, principalmente, no que diz respeito às investigações do caso leva-nos a duvidar da imparcialidade destes agentes. Além do mais, assassinatos de sindicalistas tornou-se corriqueiros no município de Rio Maria.
Expedito Ribeiro de Souza, sucessor de João Canuto na presidência do Sindicato, dá continuidade à luta camponesa pela reforma agrária. No entanto, a impunidade impera e os assassinatos contra as lideranças sindicais dos trabalhadores rurais continuam. Em 02 de fevereiro de 1991, Expedito Ribeiro é assassinado a mando do fazendeiro Jerônimo Alves de Amorim. Amorim vai a julgamento após anos de lutas do STR de Rio Maria, do Comitê Rio Maria e da Comissão Pastoral da Terra (CPT).
Embora se reconheça o valor excepcional da espetacular condenação pela morte de Expedito Ribeiro, do fazendeiro Jerônimo Alves do Amorim em 06.06.2000, e pela condenação de Adilson Carvalho Laranjeira[2] e Vantuir de Paula, pela morte de João Canuto, em 29.05.2003, deve-se afirmar que estes foram os primeiros e únicos mandantes de assassinatos contra trabalhadores rurais a serem responsabilizados judicialmente. Ressalte-se no entanto, que o fazendeiro Jerônimo Amorim cumpre prisão domiciliar e os dois outros fazendeiros aguardam julgamento de recurso em liberdade. Mesmo condenados por julgamento popular, devido influências políticas, dificilmente cumprirão a pena atrás das grades.[3]
Carlos Cabral Pereira sucessor de Expedito e genro de Canuto a época (1991), foi ferido num atentado a bala a mando do latifúndio em 04 de março de 1991, ou seja, um mês depois do assassinato de Expedito Ribeiro. E cinco anos após a morte de João Canuto, em 22 de abril de 1990 três de seus filhos, Orlando, José e Paulo Canuto, foram seqüestrados e dois deles José e Paulo foram assassinados, somente Orlando Canuto escapa gravemente ferido.
O caso Canuto simbólico na luta camponesa pela reforma agrária, no Pará e no Brasil, foi antecedido de outros assassinatos brutais, na região, como o agente pastoral Raimundo Ferreira Lima (Gringo) em maio de 1980 e o lavrador Belchior Martins da Costa:
Assassinado no dia 02.03.1982, por disputa de terra, quando colhia sua roça de arroz. Conforme declarações da época, o corpo foi perfurado por 140 tiros, mas a policia não fez nenhuma perícia[4].
Diante do grande numero de conflitos no campo e assassinatos por encomenda de lideranças sindicais, Rio Maria ficou conhecida como “A Terra da Morte Anunciada”[5] e símbolo da luta camponesa no Pará e no Brasil. E o Estado do Pará o símbolo da impunidade no campo, passando pelo assassinato do ex-deputado e advogado de posseiros do Sul do Pará, Paulo Fonteles, ocorrido em 11 de junho de 1987 e posteriormente o deputado estadual e advogado João Batista, 1988; pelo massacre de Eldorado dos Carajás/PA em 17 de abril de 1996, onde foram assassinados pelo aparato estatal da Polícia Militar 19 trabalhadores rurais sem terras, e também de tantas outras lideranças sindicais e religiosas como o assassinato da Irmã Dorothy Stang, 73 anos, em 12 de fevereiro de 2005, no município de Anapu/Pará.
Diante deste relato histórico, nesse dia 18 de dezembro de 2010, a exatos 25 anos do assassinato do sindicalista João Canuto de Oliveira, cabe reafirmar que:
A luta pela reforma agrária e pelo socialismo são absolutamente atuais, desta quadra histórica, deste momento brasileiro e, mais do que nunca é preciso exemplos para reforçar o caráter das mudanças para o desenvolvimento, com valorização do mundo do trabalho para o futuro de progresso social da nação brasileira[6].
Portando cabe exigir do governo da presidente eleita Dilma Rousseff que teve uma vitória de grande significado para o povo brasileiro, rumo as mudanças em curso e na construção de um Novo Projeto de Desenvolvimento Nacional, uma atuação contundente no combate aos assassinatos no campo, a grilagem de terras, ao trabalho escravo, pelo fim da impunidade e pela implementação efetiva das reformas estruturantes do país, como a reforma agrária para a promoção da justiça social no campo e por um país soberano, democrático, desenvolvido e socialmente mais justo.
1] Secretário Sindical do Comitê Estadual do PCdoB/Pará; Secretário Geral da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil – CTB/Pará; Acadêmico de Direito e bolsista do ProUni no Centro Universitário do Pará – CESUPA; Ex-Secretário Geral do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Rio Maria-Pará (1998-2000)
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