"Desculpa falar com você e comer uma fruta ao mesmo tempo. Se não for assim, fico sem almoçar", disse Manuela ao telefone, direto de seu gabinete. A deputada do PCdoB tem uma agenda agitadíssima, mas não hesitou em conceder a entrevista quando soube que o objetivo era falar com o público jovem.
Manuela, apesar de novinha, tem um currículo pra lá de invejável. Sua militância começou cedo, aos 17, quando resolveu cursar jornalismo na PUC e Ciências Sociais na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, simultaneamente. Nessa época, se envolveu no Diretório Acadêmico e não parou mais. Depois de formada, tornou-se vice-presidente da UNE e, em 2004, foi eleita vereadora pela cidade de Porto Alegre. Detalhe: foi a mulher mais votada naquele ano. E foi na reeleição do presidente Lula que Manuela foi escolhida para integrar o time de deputados federais. Ou seja, com apenas 24 anos ela já se preparava para levantar a bandeira da educação e das questões que envolvem a juventude de forma oficial. Seu mandato se encerra no fim deste ano, mas Manuela já está pronta para tentar a reeleição.
Confira os principais trechos da entrevista concedida ao site Oba-oba com a deputada que veio para mostrar que a idade não é um fator relevante na hora de fazer política.
Oba-oba: Qual foi o papel da internet durante suas campanhas?
Manuela D'Ávila: Trabalhamos sempre de uma forma diferente, com uma forte atuação pela internet, que em um primeiro momento chegava a ser novidade. Somos a geração da internet, faz parte do dia-a-dia da maioria dos jovens, portanto, o uso de ferramentas de internet e mídias sociais faz parte da postura jovem, é natural. Acredito que o uso disso me ajudou muito nas campanhas, entre outras ferramentas.
Oba-oba: Você acredita que o espaço para jovens na política está aumentando?
MDA: Eu diria que está crescendo, mas não na velocidade e tamanho necessários. Ainda falta muito. A questão é que, apesar de muita gente não saber, temos vários políticos jovens tentando fazer política. O erro deles, no entanto, está em deixar de ser jovem. Eu continuei como sou e as pessoas aprenderam a aceitar. Tenho muitos votos de terceira idade, por exemplo, afinal essas pessoas têm netos, o que acaba proporcionando essa identificação. Não adianta você ser jovem e ter atitude similar a de todos os que estão atuando na política.
Oba-oba: O que falta para que esse espaço se amplie?
MDA: Existem muitos partidos conservadores e isso afasta os jovens. Outra coisa: jovens políticos não têm espaço para campanha na televisão. Chegamos à questão das cotas, há uma lei, por exemplo, que determina que 30% dos políticos do país devem ser mulheres. Por que não uma cota para jovens? Ou um outro exemplo, você só pode se candidatar a uma vaga no Senado se tiver mais de 35 anos. Quem falou que a idade te impede de assumir um mandato destes? As opiniões são diferentes e isso vai além do partido, mas não deve ser uma justificativa para afirmar que o jovem não tem condições de assumir tais responsabilidades. Precisamos de uma reforma política urgente, para que situações como essas sejam tratadas de forma diferente. Além disso, não basta militar, se manifestar, os jovens devem elaborar mudanças, aparecer com propostas de fato. A reforma do sistema tem que incluir os jovens.
Oba-oba: Existe muito preconceito entre os políticos mais velhos?
MDA: Bom, quando eu concorri à prefeitura de Porto Alegre, em 2008, um dos meus adversários criou uma charge onde eu era uma criancinha com um urso na mão, entregando um papel para um adulto, como se fosse um boletim. Ou seja, esse era e continuará sendo o principal argumento dos meus adversários: a minha idade. A ideia é mostrar para as pessoas que uma candidata nova não daria conta, mas meu caminho político fala por si só. Isso não deveria ser um critério... O fato de eu estar filiada ao PCdoB há 11 anos poderia ser um critério, por exemplo. Enquanto muitos políticos vivem trocando de partido, eu me mantive fiel.
Oba-oba: Qual a sua análise do governo Lula?
MDA: O Brasil é definitivamente um país melhor. O presidente Lula vai entregar um Brasil completamente diferente do que ele recebeu. Somos uma nação mais democrática, uma sociedade que se manifesta com mais liberdade. Não podemos ignorar o fato de ele ter diminuído os índices de desigualdade social e a significante geração de empregos, mesmo em período de crise. No Prouni, por exemplo, são mais de 500 mil pessoas incluídas, parece pouco, mas é muito. Temos um país soberano, é bom ver o Brasil e ter orgulho. Quando eu era adolescente, ouvia música norte-americana e usava camisetas com a bandeira dos Estados Unidos. Hoje em dia, tudo que é brasileiro é mais valorizado, a própria música, o samba, as Havaianas... Ele resgatou o patriotismo nos brasileiros, por razões concretas, e isso tem uma profunda relação com a política externa nacional. Apesar de não ser do mesmo partido que eu, tenho uma enorme admiração pelo presidente Lula e fico emocionada quando ele diz que é o presidente que nunca estudou e que mais construiu escolas técnicas e universidades. Acho que ele sabe bem o valor disso, já que não teve acesso.
Oba-oba: Apontaria fatores negativos do governo dele?
MDA: Acho que a relação com o Congresso poderia ser melhor do que é, apesar de saber que não é tão simples assim. Temos uma caminhada muito grande, é o começo da formação de um Brasil acima das expectativas.
Oba-oba: Você já foi vice-presidente da UNE, portanto, gostaria de saber a sua opinião em relação ao Movimento Estudantil nos dias de hoje.
MDA: Eu penso no Movimento Estudantil dividido em duas fases: durante o período da ditadura militar e agora, na democracia. Acho muito injusto a forma como tratam o Movimento atualmente. Na minha opinião, grande parte das críticas tem a ver com a falta de entendimento dos limites de hoje. O Movimento luta em várias frentes e as pessoas nem imaginam, não ficam sabendo, como a história da reserva de vagas. Foram dez anos de luta e poucos sabem o quanto foi difícil. Ou a proposta que tramita agora nas Casas, para que 50% dos lucros obtidos no programa do pré-sal sejam destinados exclusivamente à educação. Acho impossível comparar o Movimento Estudantil dos anos 1970 e de hoje em dia. É injusto com as duas gerações. Não se constrói um país apenas gritando alto, precisamos de propostas, de gritos e propostas, e a UNE é umas das entidades mais propositivas. Esse saudosismo dos estudantes da ditadura é errado, eles lutaram e sofreram para que nós pudéssemos viver a democracia de hoje. Admiração e respeito são fundamentais.
Oba-oba: Como é a Manuela na vida pessoal? Você consegue conciliar os compromissos diplomáticos com o seu dia-a-dia jovem?
MDA: Olha, no começo eu penei um pouco, sempre fui muito workaholic, mas hoje sei bem como equilibrar as coisas. Passo a semana toda em Brasília, longe dos meus amigos, então quando eu tenho a oportunidade, aproveito. Aprendi também a separar os tempos e me acostumar com algumas situações. É engraçado, as pessoas me encontram num show por exemplo, e querem conversar comigo sobre política. Eu gosto de sair pra dançar, adoro MPB e samba, inclusive minha escola de samba ganhou este ano, a Imperatriz Dona Leopoldina. O segredo está no equilíbrio mesmo.
Fonte: site Oba-oba
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